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domingo, julho 21, 2024
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1983: Há 40 anos Itapiranga vivia o drama da maior enchente já registrada

A cena é parecida com a de um filme de terror: ruas alagadas, famílias desabrigadas, inundação do comércio e prédios públicos, casas levadas pela fúria das águas. A enchente traz inúmeros danos materiais. Maiores ainda, são os danos psicológicos em cada morador atingido por uma tragédia desta natureza. A reconstrução depois de uma enchente leva tempo. Às vezes as marcas ficam por anos, lembrando o ocorrido, mas as maiores cicatrizes estão fincadas nas lembranças de quem a viveu.

Julho de 1983. Há exatos 40 anos, o inverno chegava com força em Santa Catarina. Com ele, a chuva que insistia em cair desde o fim de abril.

Na edição 320 do jornal Vale do Uruguai de 10 de junho de 1983, (um mês antes da grande enchente do Rio Uruguai) os seguintes dizeres abriam a matéria: “Desde o dia 26 de abril (1983) está chovendo no município de Itapiranga. O máximo é um dia sol. As lavouras de soja estão perdidas. O milho está deteriorando na roça. O feijão também está perdido. O auge da enchente foi na madrugada e durante todo dia de sexta-feira, dia 20, quando os rios encheram tanto que levaram pontes, invadiram estradas, levaram casas, galpões, chiqueiros, galinhas, patos, suínos e bovinos. Não houve vítimas, mas existem agricultores que perderam quase todos os bens. […]. Na tarde do dia 19 de maio, por volta das 13 horas, uma chuva forte atingiu todo o Oeste de Santa Catarina. Em Itapiranga esta chuva formou verdadeiros rios nos leitos das estradas. Muitas pessoas tiveram dificuldades para ir ao serviço em consequência das inundações. A água vinha dos morros trazendo pedras e barro. […]. As águas fortes estragaram muitas estradas e levaram algumas pontes, como é o caso da ponte no morador Klaus, em Cristo Rei. O Rio Macaco Branco passou por cima das pontes na maior parte dos lugares. […]. Os maiores estragos aconteceram ao longo do rio Pepery-Guaçú. Este rio, que faz a divisa entre Brasil e a Argentina, cresceu rapidamente de madrugada. Na sexta-feira, dia 20, a maior parte dos moradores ainda estava dormindo quando o volume de águas do rio aumentou em questão de minutos. Muitas comunidades foram atingidas. No lado argentino a fúria da água arrancou árvores numa larga faixa de terra. No lado brasileiro as vítimas começaram por Raigão e terminaram na Linha Aparecida, passando por Linha Bonita, Pitangueira, Conceição, Coqueiro, Dois Saltinhos e São Ludgero. […]. O Rio Uruguai também aumentou muito o seu volume de águas, chegando a atingir aproximadamente 10 metros acima do seu nível normal. […]. O prefeito Luiz Frantz decretou estado de emergência em todo município por causa das chuvas e enchente”.

Os dias foram passando, novamente no fim de junho a chuva começou a cair incessantemente e, em 08 de julho de 1983, as águas saíram do leito do Rio Uruguai para invadir as ruas, arrastando tudo pela frente. Era o começo de uma das maiores enchentes vividas pelos itapiranguenses. Conforme dados e registros da prefeitura de Itapiranga, o Rio chegou a marca de 15 metros e 20 cm acima do nível normal. O cenário deixado pela enchente foi de muitos prejuízos.

De acordo com José Heckler, que na época atuava como extensionista da ACARESC, foram repassadas informações preventivas para a população começar a retirar seus pertences das casas ribeirinhas. “O rio foi subindo gradativamente. Lá pelas 13h já começou a alagar a prefeitura”, lembra.

Heckler afirma que não somente Itapiranga, mas a região e praticamente todo o estado sofreram prejuízos com a enchente de 1983. A enchente de 1983 atingiu 135 cidades de Santa Catarina. Foram 198 mil desabrigados, pelo menos 49 mortos (não há um número oficial) e 32 dias de isolamento total em alguns pontos do Estado.

José lembra que durante a enchente as águas do rio estabilizaram, começaram a diminuir, mas sofreu um repiquete, ou seja, chuvas isoladas ou abertura de barragens fizeram com que o nível do Rio Uruguai voltasse a subir. “O que ele tinha baixado, ele subiu ao nível que ele estava”, comenta.

Heckler afirma que as árvores ao longo do rio, na Avenida Uruguai, foram  praticamente todas dizimadas. “Não haviam tantas árvores como hoje, mas o que havia, foram praticamente todas arrancadas devido as fortes correntezas que ali se formaram”.

José enfatiza que, na época, a Prefeitura Municipal não tinha as condições financeiras da atualidade, mas que fez o máximo para limpar e auxiliar na reconstrução dos estragos.

Uma casa levada pela fúria das águas

As tragédias ocorridas em função das forças da natureza acabam potencializando ainda mais a noção de desamparo. A natureza pode ser muito violenta e essas tragédias nos mostram o quanto somos pequenos diante das fúrias da água.

Durante o catastrófico episódio da enchente de 1983, a família de Celestino e Irene Wesendonck, moradores da cidade de Itapiranga, perderam sua residência, que foi arrancada e levada pela fúria das águas. Quem nos conta um pouco sobre esse fatídico evento, é Ivo Wesendonck, popular Ivinho, filho do casal.

Na época, Ivo contava com 33 anos, já casado e com filhos, não morava mais com os pais. Lembra que na casa residiam os pais e a irmã mais nova. “Minha família começou a residir nesta casa em 1965 e poucos dias depois já tivemos a casa alagada por uma enchente. Então, foram vários momentos ao longo dos anos que a gente precisou ‘levantar acampamento’, tirar os pertences da casa”, explica.

Ao falar da enchente de 1983, Ivo afirma que a família novamente já havia [p2] retirado todos os pertences da casa, “mas sempre na esperança de que a enchente não acontecesse, porém, inevitavelmente aconteceu”, afirma.

A casa estava localizada entre a Av. Uruguai e o Rio Uruguai, logo ao lado de baixo do prédio que hoje está localizado o Fórum.

Wesendonck relembra que naquele dia havia uma grande concentração de pessoas perto da residência da família. “A correnteza estava muito forte. A água chegava à altura das janelas. De repente a força da correnteza girou a casa e ela sumiu. Lá se foi a casa. Ela emergiu novamente lá na região do Porto da Barca, toda quebrada. Sabíamos que as enchentes chegariam na nossa casa, mas sempre pensávamos que não seria ao ponto de arranca-la. Foi uma imagem que ficou na minha memória e acredito que não se apagará. Mais triste que isso, foi presenciar muitas pessoas aplaudindo quando a casa foi levada pela correnteza, afinal, muitos dos que estavam lá, estavam lá pois queriam ver isso acontecer. Espero que essas pessoas não tenham passado por algo similar, porque é muito doloroso”, comenta.

Depois do triste ocorrido, a família contou com auxilio e ajuda de familiares, amigos e população em geral para a reconstrução da casa. “Cito aqui especialmente famílias da Linha Becker e São Ludgero, que doaram praticamente toda a madeira para a casa”, frisa.

Ivo comenta também que de todas as enchentes que presenciou até hoje, sem dúvidas a de 83 foi a maior e mais triste de todas.

2014: OUTRA GRANDE ENCHENTE

31 anos após, em 2014, as águas do Rio Uruguai novamente ocasionaram grandes transtornos. No dia 28 de junho os níveis das águas atingiram 14,59 metros acima do seu nível normal. Após levantamento, constatou-se que mais de 90 famílias foram atingidas diretamente pela enchente, além de 83 comércios e 25 prédios públicos.

Por Suelen Dapper/ Jornal Expressão


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